Maria Rosa Del Gaudio Santos - Departamento de
Pós graduação em educação pesquisa
e extensão UNINCOR – Campus Betim
Leiva de Figueiredo Viana Leal - Orientadora
JUSTIFICATIVA
• Experiência como professora, pedagoga e
integrante de uma equipe de assessoria pedagógica às escolas
da RMB.
• Exercício de estranhamento: professor(a) como sujeito social,
ator e autor do seu processo de formação / professora alfabetizadora:
que saberes são apropriados?
OBJETIVOS
• Que saberes são apropriados pelas professoras
alfabetizadoras nos seus processos de formação continuada
(período 2002 a 2004)?
– Identificar/mapear as propostas de formação continuada
das quais as professoras alfabetizadoras da RMB têm participação
nos últimos três anos.
– Apreender os saberes apropriados pelas professoras, buscando identificar
alguns fatores que influenciam nessa apropriação.
METODOLOGIA
• Investigação qualitativa –
Estudo de caso.
• Contexto da pesquisa – RMB / Regional pedagógica
/ duas escolas pertencentes à mesma escola.
• Sujeitos da pesquisa: quatro professoras alfabetizadoras.
• Instrumentos de coleta de dados: questionário sócio-econômico-cultural,
entrevistas semi-estruturadas, análise de documentos.
REFERENCIAL TEÓRICO /
RECORTES CONCEITUAIS
• Modelos de Formação continuada:
– Os diferentes paradigmas de formação de professoras,
entre os quais Nóvoa (1997, p.23 ) situa a formação
de professores na encruzilhada do desenvolvimento pessoal, profissional
e organizacional;
– A formação de professores como profissionais reflexivos
Donald Schon (In Nóvoa, 1997, p.79 e Alarcão, 1996, p.82);
– A formação de professores baseada em competências
(Perrenoud, 2000);
– A formação de professores que tem como perspectiva
a prática docente (Sacristan, 2000, p.363) (Canário, 1997,
p.74) (Dominicié(1995).
• Conceitos que circulam na atualidade a respeito da alfabetização
? Soares (2003) – a aprendizagem da língua materna é
um processo permanente, mas é preciso diferenciar um processo de
aquisição da língua escrita de um processo de desenvolvimento
da língua / Abordagem sobre os métodos de alfabetização;
? Frade (2003) – o conceito de letramento inclui o conceito de alfabetização,
mas em termos de planejamento educacional é necessário que
haja ações específicas / Abordagem sobre os métodos
de alfabetização;
? Cagliari – aprender a ler é o segredo da alfabetização
e isso só se adquire com os conhecimentos sobre o funcionamento
da escrita e da decifração e como a escrita e a fala se
relacionam;
? Lemle – alfabetização é um processo de representação
de fonemas em grafemas e vice-versa;
? Macedo (2001) – reconhece os resultados da pesquisa de Ferreiro
e Teberosky, mas questiona se os conhecimentos sobre as relações
entre o sistema fonográfico e o sistema alfabético / ortográfico
são suficientes para a formação de sujeitos letrados;
? Leal (2004) – a escola precisa rever o seu projeto pedagógico
de modo a incorpora-lo uma “concepção mais ampla do
ato de ensinar a ler e a escrever”.
BUSCANDO UMA DEFINIÇÃO: APROPRIAÇÃO
“Apropriar-se de alguma coisa não parece
ser um ato passivo de recebimento de algo pronto e acabado, mas relaciona-se
a um processo ativo por parte de um sujeito que realiza uma adequação/ajustamento
entre o que lhe está sendo apresentado e aquilo que já tem
desenvolvido em relação a esse objeto. Apropriar-se requer
um sujeito – aquele que vai realizar esse ato – e um objeto
específico que será apropriado por esse sujeito.”
(ALBUQUERQUE, 2001)
ADOTANDO UMA POSIÇÃO:
A DEFINIÇÃO DE SABERES
Em Tardif (2002, p.60) encontramos a noção de “saber”
num sentido amplo que “engloba os conhecimentos, as competências,
as habilidades e as atitudes das docentes, ou seja, aquilo que foi muitas
vezes chamado de saber, de saber-fazer e de saber-ser”.
• Três concepções do saber:
? A representação
? O discurso assertivo
? A discussão
(Tardif e Gauthier, 2002, p. )
ANALISE DOS DADOS:
DECISÕES METODOLÓGICAS
• A contribuição da noção
de habitus em Bourdieu
“eu desejava por em evidência as capacidades “criadoras”,
activas, inventivas, do habitus e do agente (que a palavra hábito
não diz), embora chamando a atenção para a idéia
de que este poder gerador não é o de um espírito
universal, de uma natureza ou de uma razão humana (...), o habitus,
como indica a palavra, é um conhecimento adquirido, e também
um haver, um capital (de um sujeito transcendental na tradição
idealista. O habitus, a hexis, indica a disposição incorporada,
quase postural, mas de um agente em ação (...) o lado activo
do conhecimento prático”. (BOURDIEU, 1998, p.61)
ANALISE DOS CONTEÚDOS
“a análise de conteúdo assenta-se
nos pressupostos de uma concepção crítica e dinâmica
da linguagem. Linguagem, aqui entendida, como uma construção
real de toda a sociedade e como expressão da existência humana
que, em diferentes momentos históricos, elabora e desenvolve representações
sociais no dinamismo interacional que se estabelece entre linguagem, pensamento
e ação”
(Franco, 2003, p.14)
“uma das importantes finalidades da análise
de conteúdo é produzir inferência sobre qualquer um
dos elementos básicos da comunicação”
(Franco, 1997, apud Bardin)
• Conteúdo inferido dos discursos orais (entrevistas)
e escritos (questionários, anotações de cursos) ×
análise dos documentos sobre as propostas de formação
continuada × referenciais teóricos = respostas as questões
colocadas.
MODALIDADES E MODELOS DE FORMAÇÃO CONTINUADA NO CONTEXTO
DA PESQUISA E SUAS RESPECTIVAS CONCEPÇÕES DE ALFABETIZAÇÃO
• Modalidades de formação de educadores
da RMB:
? CEFE;
? Regional Pedagógica;
? Equipe de formação de professores;
? Escola;
? Em outras instâncias.
• Modelos de formação continuada X Paradigmas de formação:
? CEFE: Racionalidade técnica (Gomes, 1997, apud Schon, 1983),
abrangendo dois componentes: o científico-cultural e o psicopedagógico;
? Regional Pedagógica: Treinamento e encontros de vivências
(Kramer, 1989, p.194);
? Equipe de formação de professores: forma escolar (Demailly,
1997, p.146);
? Escola:
Escola A – Modelo de formação organizacional (Nóvoa,
1997, p.29)
Escola B – Modelo
? Em outras instâncias: Treinamentos e encontros de vivências;
? Assumindo uma posição: a escola como local de formação.
A CONCEPÇÃO DE ALFABETIZAÇÃO
SOB A PERSPECTIVA DO CONTEXTO EM ANÁLISE:
• Diversidade de concepções teóricas
e práticas propostas:
? Sóciointeracionistas;
? Linguística;
? Psicolinguística.
• Sugestões de atividades que levam o educando a perceber
a relação entre fonema e grafema e vice-versa, relação
entre a especificidade da alfabetização e os usos e funções
sociais da leitura e da escrita;
• Conflito conceitual e prático em relação
ao uso de métodos para alfabetização e a teoria construtivista;
• A palavra método tanto pode designar um pequeno livro,
um tratado elementar, como um conjunto de princípios pedagógicos,
psicológicos ou linguísticos que definem objetos e meios
adequados para atingi-los. (Frade, 2003, p.19 apud Chartier e Herbrand);
• “A existência de princípios gerais retirados
das diversas ciências contemporâneas não seria incompatível
com tendências sociointeracionistas e construtivistas.” (Soares,
1990, p.15).
SABERES DITOS APROPRIADOS PELAS PROFESSORAS NOS SEUS PROCESSOS
DE FORMAÇÃO CONTINUADA
• Os sujeitos da pesquisa: uma fotografia;
? Professoras como sujeitos sócio-culturais;
? Idade, tempo magistério, tempo alfabetizadoras.
• Professoras como sujeitos efetivos;
• Professoras como sujeitos de linguagem;
• Professoras como sujeitos da temporalidade e da corporeidade;
• Singularidade de ser professora e a sua relação
com os alunos e com os formadores;
• A singularidade de ser professora – as marcas da escola.
CATEGORIAS DE ANÁLISE:
A BUSCA POR UMA LEITURA DE SABERES APROPRIADOS
• Sistema de disposições;
“tem um curso que eu fiz com a Márcia. Eu era doida para
fazer um curso com ela. Eu fui ver a lista e o meu nome não estava
lá para participar . Aí eu falei: eu vou assim mesmo. Cheguei
lá e falei: eu estou aqui de intrusa, mas não vou sair.
E eu fiquei... Foi ótimo...” (Vitória)
“Eu gostaria muito de participar dos cursos oferecidos pela Regional,
mas só chamam os novatos. Mas não tem problema, eu tenho
uma amiga que vai e passa tudo para mim!” (Petúnia)
• Convicção;
“eu não faço mesmo, só faço o que acredito!
Tem que me provar que dá certo!” (Margarida)
“o meu processador é assim: o que presta eu guardo, o que
não presta eu não guardo não, não guardo não”...(Margarida).
“para mim, cada um é cada um. Cada um tem seu ritmo. Nessa
questão de ritmo eu prego muito que a qualidade é necessária,
a quantidade não”. (Margarida)
• Seleção;
“não é tudo que você aproveita, né, mas
alguma coisa... algum texto de reflexão, alguma técnica
de brincadeira, igual esses jogos matemáticos, igual o da carta,
teve carteiro, dobradura... Agora eu pincelo muito, tem muitas coisas
que não dá para aproveitar em sala de aula”. (Dalila)
“o que eu faço aprendi mais na prática
mesmo; vou vendo o que dá certo e o que não dá. A
teoria ajuda, ajuda você a conhecer e aplicar na hora certa o que
é necessário”. (Petúnia)
• Significativo / vivenciado.
“Tratou de portfólio. Nós, professores temos mania
de trabalhar muitas coisas e não registrar. Achei o curso bom por
isso. Agora tudo que vou fazendo com os alunos, vou registrando. Eu não
tinha percebido que isso era importante. Depois do curso eu comecei a
guardar e mostra para os meus alunos, comecei a montar o portfólio
da turma.” (Vitória)
SABERES APROPRIADOS:
UMA RAZÃO PRÁTICA
“Quando os sujeitos são capazes de apresentar
razões que justifiquem os seus atos demonstram ter se apropriado
de conhecimentos, habilidades e atitudes...”
(Tardif, 2002)
“Saberes não residem no sujeito, mas nas
razões que apresenta para tentar validar em e através de
uma argumentação, um pensamento, um ato.” (Tardif,
2002)
SABERES VEICULADOS NA FORMAÇÃO CONTINUADA
• Método de alfabetização:
analítico, sintético e imersão;
• Procedimentos para a alfabetização: partir de um
texto pequeno de memorização, retirar palavras, analisar
o número de letras da palavra, o número de palavras do texto,
a posição das letras na palavra, a relação
letra – som, som – letra;
• Trabalho com projetos: conceito, passos para o trabalho com projetos,
exemplos de projetos da turma da Mônica, do álbum de figurinhas;
• Letramento: o trabalho com diferentes gêneros textuais,
conceito de leitura, relação leitor e leitura, descritores
de textos.
“Saber algo significa que o indivíduo particular
se apropria dos conteúdos de seu meio, incorpora neles sua própria
experiência, conseguindo desse modo, levar a cabo os mais heterogêneos
tipos de ações cotidianas”.
( SALGUEIRO, 2003, p. 223)
Os saberes apropriados pelas professoras em seus processos
de formação continuada são influenciados por seu
habitus e se expressam em um saber-ser e em um saber-fazer (Tardif, 2002,
p.181) relacionados à sua dimensão pessoal e profissional.
Nesse caso o habitus pode se transformar em um estilo de ensinar, em truques
do ofício da profissão, ou mesmo em marcas da singularidade
de ser professora, denominada por Tardif como personalidade profissional.
CONCLUSÃO
• Por meio da exigência da racionalidade,
as professoras explicitam razões de ordem prática para falar
dos saberes que se apropriaram. Razões apontadas como intervenientes
nos saberes apropriados pelas professoras:
? A aplicabilidade da atividade em sala de aula, dando a “receita”
passo a passo;
? O espaço da escola, tornando possível a troca de experiências,
a discussão dos problemas reais e as possibilidades de se encontrar
soluções;
? A tomada de consciência em relação à importância
da atividade (portfólio);
? A relação formador e formando, denotando os espaços
de quem é o dono do saber e quem deve aplicar esse saber em sala
de aula;
? O desejo de participar, a busca pelo novo, pela novidade;
? As condições que estruturam o seu trabalho em um lugar
social.
• Verificou-se que as professoras possuem esquemas que permitem
formar o que Perrenoud diz ser um novo “estrato” de habitus
que não tem sua gênese na vida real, mas em uma experiência
de grupo. Quando as professoras e os/as formadores/as se confrontam em
uma dinâmica de formação em que um é o que
detém o saber do conteúdo a ser ensinado e das metodologias
de ensino, e, o outro é o que vai aprender para refazer na prática,
existe um ponto em comum: os esquemas tanto do ensinante quanto do aprendente
escapam, pelo menos em parte, à consciência desses atores
e se inserem em estratégias didáticas conscientes, surgindo
os mecanismos de regulação que lhes permitem reagir de diferentes
maneiras frente aos saberes.
• Os saberes apropriados pelas professoras, sujeitos sócios
culturais é condicionado por seu habitus: razão e inconsciente
coexistem e cooperam um com o outro o tempo todo no ser humano;
• Pistas para os formuladores de políticas públicas
de formação de professores e para outros órgãos
que se ocupam da formação continuada e da alfabetização:
compreender o processo de formação de professores na dimensão
que Nóvoa defende, qual seja, a dimensão de um processo
que incorpora o desenvolvimento profissional, pessoal e o organizacional.
• Assumindo uma posição:
? Processos de reflexão na ação, reflexão
sobre a ação, reflexão sobre a ação
na reflexão (Schon) possibilita aos professores a tomada de consciência
em relação às formas como estruturam o seu pensamento,
seus afetos e suas estratégias de ação (Gomes, 1997).
? Necessário que haja lideranças capazes de fazer emergir
reflexões teóricas a partir da prática e dos problemas
reais.
? A professora é um sujeito prático autônomo (Perrenoud,
2000) sobre o qual a formação tem um poder limitado ou não,
influente ou não – saberes veiculados nos processos de formação
estão sujeitos a várias leituras por parte dos autores sociais
que mobilizam não só a sua lógica natural, mas muitos
outros esquemas que estão ancorados na sua história de vida,
nas relações com os outros, nos gostos e afetos, no tempo
e nas escolhas, nos gestos e nas palavras.