Danusia Apparecida Silva - Universidade do Planalto
Catarinense /UNIPLAC
Aproximar as crianças dos livros mesmo sabendo
que elas são mais atraídas pelas novidades da televisão
ou do computador é tarefa hercúlea e leva muitos professores
à frustração. No entanto há sempre os que
não se dão por vencidos, movidos pela certeza de que vale
a pena prosseguir na luta “se a alma não é pequena”,
como declara Fernando Pessoa.
Imprescindível, pois, é oferecer aos pequenos e adolescentes
oportunidades de alargar seus horizontes, seu conhecimento, dar espaço
aos sonhos e criar até mesmo além de suas próprias
condições, com base nas histórias ouvidas e lidas.
O território da leitura em nossas escolas ainda é, porém,
muito pouco invadido e entre os alunos espalha-se a notícia de
que lá existem cobranças, desprazer, obrigação.
Considerando a literatura como uma possibilidade de aprimoramento cultural
e aprofundamento do senso crítico, incentivou-se a leitura dos
livros infantis e infanto-juvenis escritos pelos catarinenses que a partir
de 1970 vêm produzindo com a atenção voltada para
a criança e o adolescente. A seara é grande e a produção
embora, ainda, modesta em quantidade, revela-se pela qualidade.
O Projeto Ler para conhecer a Literatura Infantil e Juvenil Catarinense
iniciado em 2002 constatou a inexistência de livros infantis dos
escritores catarinenses nas bibliotecas pública e escolares, bem
como o desconhecimento dos mesmos pelos professores e alunos. Participaram
diretamente da pesquisa nove escolas, uma da rede privada, uma da rede
estadual, sete da rede municipal e quinze professores que trabalharam
com um corpus de treze livros, de sete escritores: Yedda Goulart; Werner
Zotz; Maria de Lourdes Krieger; Sérgio Jeremias de Sousa; Ana Maria
Kóvacs; Urda Alice Kluger; Paulo Venturelli. Dos quinze professores
que voluntariamente participaram do Projeto, todos são egressos
de Cursos de Licenciatura da Universidade do Planalto Catarinense –
UNIPLAC, nove oriundos do Curso de Pedagogia cuja estrutura curricular
renovada em 1997, incluiu a disciplina Literatura Infantil; os outros
provindos de anos anteriores a essa renovação curricular
não vivenciaram a Literatura Infantil em caráter disciplinar,
todavia a estudam via cursos de extensão promovidos pela Secretaria
da Educação do Município de Lages que desde 1995
ministra aulas de Literatura Infantil aos alunos das séries iniciais
(1ª a 4ª séries) em todas as Escolas da Rede. É
importante sublinhar que esses professores revelaram um desempenho admirável
na consecução do Projeto para conhecer os escritores catarinenses
e sua produção.
A exposição do Projeto foi bem acolhida pelos professores
que após um contato superficial com diversos livros dos vários
escritores catarinenses, alguns dos quais já abordados em aulas,
optaram pela obra de um deles. A princípio valeram-se do livro
tomado emprestado da professora coordenadora do Projeto, mas aos poucos,
as Direções das Escolas de quem havíamos obtido a
adesão, adquiriram alguns exemplares, ampliando, assim, o acervo
das bibliotecas.
Quinzenalmente reuniam-se professores e coordenadores do Projeto para
discutir sobre o andamento, a receptividade e a produção
dos alunos cujo interesse, atiçado pelas professoras, começava
a emergir. As produções provenientes dessas leituras foram
aos poucos estabelecendo um diálogo que se alongava do livro às
manifestações sócio-culturais: gastronomia, meio
ambiente, vegetação típica da região, enfim
um arsenal de descobertas que bem ratificam as palavras de Paulo Freire
“o ato de ler não se esgota na decodificação
pura da palavra escrita, mas (...) se alonga na inteligência do
mundo (...)” (1982, p. 12).
Seguindo a linha de Freire as professoras trabalharam o livro Aventuras
na serra, da escritora lageana Yedda de Castro B. Goulart. A narrativa
centrada na cultura do Planalto Serrano proporcionou uma viagem de aventura
e saberes através da qual as crianças de uma 3ª série
do Ensino Fundamental puderam identificar pontos e locais citados e sobretudo
desenvolver a reflexão crítica sobre o meio, a região
e a cidade em que vivem. Fizeram uma excursão e viram com seus
próprios olhos tudo quanto o livro descreve: museu, catedral, praças
e o Parque do Tanque cenário da lenda da serpente e outras.
Entre tantas atividades enviaram e-mails, escreveram carta à escritora
Yedda e solicitaram sua presença na sala de aula para um bate papo.
A escritora veio até eles, ela reside em Florianópolis,
capital de Santa Catarina. Foi um dia de festa. Para começar ela
apresentou um filme em que aparece contando a história Aventuras
na serra a seus netos. Os alunos encenaram uma peça teatral, seguindo
uma lenda do próprio livro, houve declamação do poema
O pinheiro, também de autoria da escritora. Após a apresentação
dos inúmeros trabalhos executados pelas crianças, deu-se
a hora dos autógrafos e finalmente todos, crianças, professores
e escritora saborearam deliciosos quitutes, aqueles mesmos citados na
obra, típicos da região serrana. Desse encontro escritor
e alunos leitores resultou a criação, a muitas mãos,
da história: Gralha Azul vai à escola. Foi uma exultação
geral!
Dias depois... a escritora enviou-nos um artigo do qual vale transcrever
um fragmento:
Por que escrever para crianças e jovens? E o que
escrever, que possa mover o interesse de uma geração, como
nunca antes, à informação de massa, à internet,
a jogos eletrônicos capazes de absorver sua atenção
por horas e horas?
(...)
O escritor brasileiro de literatura infanto-juvenil, mais do que nunca,
precisa acreditar no seu trabalho como algo que vale a pena ser feito
e encontrar estímulo para superar todos os obstáculos à
leitura, presentes na contemporaneidade.
(...)
Para mim, de modo especial, a oportunidade de partilhar com meus pequenos
leitores suas impressões e além disto, a mágica intimidade
que nos fez amigos compensa toda a solidão que dá vida à
criação artística.
A escritora Anamaria Kóvacs, autora do livro O
burrinho que calculava, também prestigiou os alunos de 1ª
a 4ª série da Escola Vianey. Foi uma tarde diferente para
a criançada que havia lido e realizado atividades mil motivadas
pela história.
Maria de Lourdes Krieger, autora de cerca de vinte livros endereçados
a crianças e jovens, visitou quatro Escolas: Escola de Educação
Básica Joaquim Henriques, Juscelino Kubistchek, Emilia Furtado
e CAIC Irmã Dulce. As histórias trabalhadas foram: O gato
que não sabia miar; Ana levada da breca; Brincando de olhar estrelas;
Nos ombros fortes de papai. O trabalho não ficou restrito ao espaço
da escola, pois as turmas organizaram vitrinas, expondo suas criações
e os livros da escritora na Livraria Diocesana que fica no centro da cidade,
bem distante dos bairros onde estão situadas as Escolas. Nestas,
todo o público conversou e chegou bem pertinho da escritora que
atenciosamente respondeu a todas as perguntas.
Na avaliação de Maria de Lourdes Krieger, os professores
das Escolas visitadas estão no caminho certo para desenvolver nos
alunos o gosto pela leitura. Disse ainda: “É um trabalho
que não existe, infelizmente, nem em Florianópolis. Levo
de Lages muita emoção pelo que vi e conheci nessas visitas
realizadas nas Escolas”.
Sérgio Jeremias de Souza natural de Braço de Norte e residente
em Tubarão tem 56 livros editados, alguns traduzidos para o espanhol
e o italiano. Suas obras sustentam-se nas vigas: doce e útil, prazer
e conhecimento. Foram amplamente trabalhadas nas Escolas Professor Trajano;
Manoel Thiago de Castro e Santa Helena onde crianças, professores
e comunidade acionaram-se, considerando que o escritor também é
sacerdote. Em todas as Escolas houve rica apresentação dos
trabalhos que bem comprovaram a leitura proveitosa dos livros: O pequeno
Mugli; O dragão Romeu e a Baleia Julieta; A floresta dos sentimentos;
e Um anjinho apaixonado.
A exemplo dos outros escritores catarinenses Jeremias não escondeu
a satisfação em ver seus livros inseridos no acervo das
bibliotecas das Escolas e principalmente sendo lidos por um expressivo
número de alunos. Segundo ele, “o reconhecimento só
faz crescer o trabalho do escritor e também incentiva o surgimento
de outros. Conhecer o autor de uma obra é uma forma de fazer com
que o leitor se interesse mais por suas obras”.
A experiência foi altamente positiva. Todos os escritores falaram
de sua paixão pela leitura, bem como da importância do ler.
Fizeram a semeadura e deixaram nas crianças o sabor do querer mais.
A presença do escritor em sala de aula muito contribui para a metamorfose:
transformar a criança muda telepática, sem discurso e sem
criatividade em criatura viva, disposta a seguir modelos construtivos.
Contribuíram principalmente no hercúleo trabalho: formação
de leitores.