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  O ENSINO DE MATEMÁTICA NAS SÉRIES INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: IMPLICAÇÕES DA LINGUAGEM NA COMPREENSÃO DOS CONCEITOS FUNDAMENTAIS POR PROFESSORES ALFABETIZADORES DE EAD DE CAMAPUÃ.

Nathália Leão Congro - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul – UFMS.

Neusa Maria Marques de Souza - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul - UFMS.

O presente trabalho é um estudo voltado para educação matemática e tem como foco o papel da linguagem enquanto meio de domínio necessário ao professor para a compreensão dos conceitos fundamentais a serem ensinados nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Apesar de ser necessária no meio escolar e na vida dos sujeitos que ensinam e que aprendem, devido a sua complexidade a matemática é considerada como de difícil acesso por boa parte de professores e alunos.

No fazer educativo, a linguagem matemática é o ponto de partida para a compreensão do conteúdo, podendo ser, entretanto um dos impedimentos que veda o acesso a este saber tão elaborado e necessário para a vida em sociedade pelos educandos. As deficiências neste aspecto ocasionam falhas para o domínio dos conceitos fundamentais por professores alfabetizadores, prejudicando o processo de ensino – aprendizagem.

Em cursos de Educação à Distância, além das dificuldades já existentes quanto ao domínio da linguagem matemática, pesa como acréscimo a necessidade de compreendê-la a partir de ambientes virtuais, em sobreposição com a linguagem midiática.

Por estes motivos, optou – se pelo desenvolvimento de uma investigação junto aos professores alfabetizadores que freqüentam o curso de Pedagogia na modalidade de Educação à Distância no município de Camapuã, visando compreender como se estabelece o domínio da linguagem matemática nas disciplinas que se desenvolvem neste curso e quais os reflexos de suas relações com a linguagem em suas práticas educativas.

Para sistematizar o trabalho procedeu-se a fundamentação teórica através do estudo sobre a produção encontrada no campo da metodologia da pesquisa e no campo da Educação Matemática. Neste sentido, sobre as questões objeto da reflexão deste trabalho, destacamos as concepções de alguns autores do campo da Educação Matemática.

A matemática é considerada mais árdua do que a alfabetização devido a sua menor utilização como forma de comunicação no cotidiano. Comparada com a língua materna, desde que nascemos estamos convivendo com ela, podemos desprezar suas normas e regras gramaticais, mas fazemos o uso oral constantemente, o que importa é que de uma maneira geral conseguimos realizar uma comunicação com as pessoas. A matemática não tem essa presencialidade, se restringindo apenas em atividades comerciais e salas de aula, não sendo explorada sistematicamente nos diversos ambientes.

Para Laborde (1975) a matemática pode ser compreendida como a aquisição de uma nova linguagem na qual, diferente da língua materna, o desprezo das regras não garante a manutenção da qualidade da comunicação.

Machado (1990) diz que a linguagem matemática e a materna possuem uma cumplicidade, ou seja, a linguagem matemática toma emprestada a língua materna. Para a utilização da matemática, é preciso ler e interpretar os enunciados dos exercícios e isso só é possível, com o domínio da leitura da língua portuguesa. Praticamente em todos os dias, assuntos e lugares, a linguagem matemática e a linguagem materna estão associadas nas mais diversas situações, mas dentro da instituição escolar elas são dissociadas dificultando a compreensão pelos educandos.

Para facilitar a compressão da linguagem matemática o professor deve relacionar em atividades e exercícios a linguagem matemática com a língua portuguesa em situações de leitura e escrita, deve comentar e ouvir a matemática apoiando-se em jornais, poesias, problemas propostos a partir da leitura de livros paradidáticos e de outros recursos pedagógicos.

No ambiente escolar existem múltiplas linguagens e o espaço físico pode – se dizer que fala por si só. Através deste espaço podemos analisar o tipo de prática realizada no interior da escola. Para Serres (1994, p.191) a escola virtual é compreendida como libertação dos alunos, como desviar da situação “de ter que suportar as relações violentas e brutais dos pátios do recreio, e do sufoco dos vaivéns pendulares para, e da escola nas grandes cidades congestionadas”.

Com o avanço da tecnologia os recursos da mídia penetram no ambiente educacional, a escola virtual vem se enraizando cada vez mais na escola tradicional. O computador se transformou e é encarado, não como apenas uma máquina, mas também como um meio de construir aprendizagens e de comunicação entre os diversos alunos que dele utilizam, construindo uma nova forma de linguagem.

No universo real existem várias formas de comunicação, oral, escrita, corporal que são complementadas pelas mãos, olhares, sorrisos e com estilos variados. De longe podemos reconhecer as pessoas pelas vestes utilizadas, vestidos com números maiores, utilização de piercing e tatuagens, que determinam as tribos e condutas, ampliando a distância comunicacional entre as gerações.

Segundo Kenski (2000) a linguagem audiovisual é uma expressão bastante usada pelos jovens que conseguem unificar sons, imagens e movimentos quando querem se comunicar, porém essa forma de linguagem já esta adaptada pelas novas gerações e seus usuários criam uma linguagem repleta de gírias, jogos e imagens herdadas da Internet, desaprendendo normas e regras gramaticais, sendo relevante o entendimento por educadores para a compreensão do universo juvenil.

Na escola tradicional os textos são produzidos com palavras que se aprende gradativamente e juntados uma a uma realizamos sua leitura, mas com o avanço global que a tecnologia nos submeteu os indivíduos criam outras maneiras de explorar a escrita, não mais através de leituras de livros maçantes. Os novos tempos mesclam textos clássicos com textos digitais que são carregados de linguagens audiovisuais que encantam seus aprendizes.

Dentro do novo tempo, os textos híbridos são constituídos por linguagens originais e inovadoras possuem uma forma única de ser escrito reinventado por quem os produziu, os hipertextos também são criados e ainda podem contar com subsídio de desenhos, som, simulações, jogos e outros auxílios disponibilizados.

Por fim o “ciberespace” é uma evolução educacional que não tem por intuito abolir o espaço da sala de aula das escolas convencionais. Ele nasce como uma proposta para dilatar e ampliar o trabalho na educação. A rede possibilita novas oportunidades para o educando realizar avanços intelectuais.

No cotidiano da escola a matemática deve ser contextualizada nesta realidade. O pensamento cotidiano é construído no processo de experiência social e o conhecimento cientifico é produzido dentro das salas, exigindo do aluno um esforço sistemático. Algumas dificuldades na aquisição dos conceitos matemáticos se vinculam à linguagem, que é transferida para os alunos de maneira cientifica e de forma técnica como encontrada nos livros, não adequando à realidade e nem ao contexto do aluno. As atividades propostas pra eles utilizam palavras alheias a seu domínio, dificultando a compressão dos conceitos e tornam-se empecilho para a compreensão dos conceitos matemáticos básicos.

A linguagem matemática normalmente é imposta pelos professores, não é construída com as práticas cotidianas. O ensino não pode ser algo técnico, pronto à espera do aluno com idéias pré-fabricadas e sem estimular o raciocínio, objetivando apenas a aplicação das regras e formas inflexíveis. O ensinar necessita de transformações, encaixes, modificações para a apreensão do conhecimento, caso contrário fica impossível de ser compreendido, pois se coloca acima da capacidade e do entendimento do educando.

A grande parte dos problemas encontrados na compressão da matemática é ocasionada pela falta de didática, pois os conteúdos são impostos aos educados de forma incoerente. Para facilitar o acesso é necessário que os conteúdos cheguem até os alunos de forma simplificada e na linguagem dos mesmos.

Tomando por base atividades do livro de Carvalho (2005), foi possível verificar a dificuldade com a interpretação de problemas matemáticos, pelos alunos-professores em formação do curso de Pedagogia à Distância pesquisado. Na resolução de problemas o aluno associa uma palavra que acredita ser a palavra – chave para sua resolução, cometendo equívocos quando no contexto são apresentadas ambigüidades lingüísticas. Verifica-se que trabalhar com palavras – chave incentiva o raciocínio mecânico que leva o aluno a não raciocinar, apenas a localizar a palavra que o levaria a resolução do problema.

Exemplos de palavras que remetem ao raciocínio maquinal são as palavras ganhei, acumulei, ao todo, que dão idéia de adição ou perdi, troco, restou, que dão a idéia de subtração ou ao todo que dá a idéia de multiplicação ou ainda repartir, distribuir que dão a idéia de divisão. Estas são palavras chave que os educandos associam constantemente, e é relevante entender o enunciado por completo sem que estas palavras prejudiquem a análise e interpretação do que o problema pede.

O erro na aprendizagem é constante por isso o professor deve utilizá-lo como fonte de informação, pois poderá intervir e acompanhar o aluno, descobrindo o erro e podendo auxiliá-lo quando este verbaliza o seu raciocínio, facilitando o encaminhamento para o acerto.

O trabalho com problemas convencionais ou não convencionais que também são conhecidos como problemas heurísticos, exigem um raciocínio mais aprofundado, pois não há operações claras no enunciado e o aluno precisa encontrar estratégias para resolver. Os problemas convencionais são os problemas que são resolvidos com aplicações de qualquer uma das quatro operações.

Carvalho (2005) oferece possibilidades de trabalho com problemas para melhor desenvolvimento dos alunos, uma é a leitura de imagens. Através desta constrói histórias e questionamentos de acordo com a imagem e depois elabora perguntas sobre o problema. Outra forma é completando o enunciado, propondo um problema com diferentes perguntas e muitos outros exemplos que trabalham a linguagem matemática.

O aluno quando tenta resolver um exercício envolvendo problemas, pode encontrar alguns com insuficiência de dados, que não possibilitam a chegada a uma resposta exata, mas compreendem que deve haver uma solução. Neste tipo de problema costuma – se faltar dados, números ou são solicitadas respostas que são improváveis de serem encontradas. O oposto deste problema é o excesso de dados, o aluno julga que todas as informações devem ser utilizadas e ele irá descobrir quais são os dados necessários para encontrar as respostas.

Com ampla variedade de exercícios é possível despertar nos alunos a leitura, desenvolver linguagens orais, pictóricas e escritas, questionamento dos problemas, aplicações dos conhecimentos matemáticos nos problemas propostos. Contudo os vários exemplos explicitados no livro servem de eixo norteador ao professor para adaptar as estratégias (o ensino) à realidade do aluno, incentivando-o a resolver vários tipos de problemas, despertando sua alta confiança em soluções que encontram para os problemas propostos, desenvolvendo o respeito à solução encontrada pelo colega.

Contudo este trabalho tem como principal objetivo investigar a influência que a linguagem matemática exerce para a compreensão dos conceitos fundamentais desta disciplina pelo professor alfabetizador e as possíveis implicações que os problemas relativos ao domínio desta linguagem podem causar para o ensino dos conceitos fundamentais nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

As considerações desenvolvidas neste trabalho são fruto da análise inicial de questionários aplicados aos estudantes do 4º ano de Pedagogia na modalidade de Educação à Distância, disposto em duas etapas.

A primeira foi composta por sete questões referentes à formação inicial, ocupação atual, suas experiências como educadores e suas dificuldades com a disciplina de matemática. O questionário foi analisado e entre as descobertas consta que entre os alunos/professores das séries iniciais do Ensino Fundamental a maioria apresenta como a maior dificuldade, desenvolver o trabalho com expressões numéricas e suas regras de operações, por exemplo: equações, sentenças matemáticas etc. Outra dificuldade é em compreender os enunciados dos problemas e/ ou exercícios.

Sendo assim foi inicialmente detectada a existência de deficiências ligadas às questões da linguagem e compreensão dos enunciados, pois apresentaram dúvidas no que de fato o problema estava pedindo como resposta. Quanto às técnicas de montagem e aplicação das quatro operações fundamentais de matemática (contas) eles conseguem realizar com sucesso e habilidade. A questão da dificuldade na linguagem foi ratificada com a resolução de alguns problemas selecionados do livro de Mercedes Carvalho, Problemas? Mas que problemas?! e através da entrevista coletiva posteriormente realizada.

Em breve análise dos questionários foi possível verificar a grande dificuldade em resolver, analisar e interpretar os problemas de lógica e os problemas que pedem a utilização de desenhos e gráficos, pois não havia contas para resolvê-los, sendo necessário para tal somente o raciocínio matemático. Das professoras que responderam as atividades que envolviam a lógica matemática, nenhuma delas conseguiu chegar aos resultados esperados. Do total dos problemas propostos, cada uma delas não obteve o resultado esperado em pelo menos 50% destes.

Após a coleta do material, o segundo passo foi à realização de uma entrevista. Utilizou-se como recurso metodológico a entrevista coletiva semi estruturada. Dispostas em círculo todas as professores discutiram e comentaram as questões, expressando suas dúvidas e certezas. Para o registro desta atividade foi utilizada gravação em fita cassete.

Através dos questionários foi possível verificar que todas as professoras sentiram dificuldades na resolução dos problemas. Sendo assim a linguagem matemática se fez necessária para a compreensão dos conceitos fundamentais e para bom entendimento dos exercícios e resoluções.

Para esta pesquisa foi escolhida como proposta metodológica a pesquisa qualitativa devido a sua abrangência e pela vantagem em facilitar ao pesquisador o contato direto com o ambiente e com a situação que esta investigando, permitindo a obtenção de ter mais êxito nos resultados. Com essa abordagem de pesquisa foi possível entender o contexto no seu cenário natural e preservar a complexidade do comportamento humano, observar os fenômenos em um pequeno grupo, interpretar comportamentos e técnicas de observação da realidade.

Na continuidade deste trabalho de pesquisa serão analisados tanto os materiais escritos como os depoimentos das alunas/professoras alfabetizadoras que participaram da entrevista.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

CARVALHO, Mercedes. Problemas? Mas que problemas?!: Estratégias de resolução de problemas matemáticos em sala de aula. Petrópolis: Vozes, 2005.

LUDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E.D.A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.

PAVANELLO, Regina Maria. Conceito Científico e Conceito Cotidiano: algumas considerações sobre ensinar e aprender matemática nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental. (In) ROMANOWSKI, Joana Paulin; MARTINS, Pura Lúcia Oliver; JUNQUEIRA, Sérgio Rogério Azevedo, (orgs). Conhecimento local e conhecimento universal: a aula e os campos do conhecimento. Curitiba: Champagnat, 2004, v .3.

SMOLE, Kátia C.S. A matemática na Educação Infantil: as teorias das inteligências múltiplas na prática escolar. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.

 
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