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EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS: DUAS GERAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICAS NO GRANDE ABC

 

Elmir de Almeida – CUFSA
Maria Elena Villar e Villar – CUFSA
Marilena Nakano – CUFSA
Marli Pinto Ancassuerd – CUFSA

Este texto tem por objetivo apresentar as análises realizadas sobre os dados coligidos na primeira fase do trabalho de campo desenvolvido junto às administrações municipais das cidades da Região do ABC, em pesquisa que aborda as iniciativas de administrações locais no campo da escolarização de jovens e adultos. Este estudo integra investigação de escopo nacional, desenvolvido em sete regiões metropolitanas do Brasil , intitulado  Juventude, escolarização e poder local. [1]

 Na primeira parte apresentamos uma breve caracterização do ABC, enfatizando aspectos, tais como: os elementos que contribuíram para a construção da unidade e identidade desta territorialidade como Região; alguns indicadores sócio-demográficos, econômicos e de exclusão social que permitem compreender o ABC como uma unidade tecida pela diversidade sócio-econômico de suas localidades e por fim realizou-se uma rápida caracterização da dinâmica sócio-política das localidades e da Região.

 A segunda parte deste texto foi integralmente dedicada à descrição e análise das políticas públicas de escolarização de jovens e adultos implementadas pelos governos municipais do ABC, no período compreendido entre 1987-2003. Nesse período, constata-se a existência de duas “gerações de políticas” de educação de jovens e adultos: a primeira marcada pelo claro recorte das políticas de um estado provedor e a segunda, percorrida pela idéia da participação e da escassez de recursos.

 Por fim, e com base nos dados trabalhados, afirma-se que, na grande maioria das administrações locais do ABC, vem se tecendo, com maior ou menor ênfase, uma rede institucional de atenção e de promoção de ações para os jovens. Portanto, a possibilidade de haver políticas públicas para as juventudes, em pelo menos cinco das sete municipalidades da Região, mesmo considerando o inquestionável caráter emergente de muitas das ações verificadas, constitui-se muito mais que uma promessa alvissareira.

 

O cenário do ABC

 O ABC paulista compõe-se de sete cidades – Diadema, Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Santo André, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul – e espacialmente integra o tecido urbano da Região Metropolitana da Grande São Paulo. Nacionalmente, o ABC ganhou projeção e é identificado como uma Região, principalmente, em função da existência e combinação de duas ordens de fatores ainda hoje presentes e atuantes em sua espacialidade urbana: a implantação e consolidação de um significativo e complexo parque industrial e a presença de um forte movimento operário e sindical.

 Este cenário não pode ser tomado como espaço isolado do país e do mundo, longe das influências do sistema mais geral, capitalista, e das estruturas de poder que ultrapassam as suas fronteiras espaciais. Mas, ao mesmo tempo, ele é produzido por forças e ações próprias desse lugar, dando-lhe uma conformação que o torna peculiar no cenário brasileiro e mundial.

 O ABC era o subúrbio, bucólico, lugar procurado por aqueles que procuravam distância do município de São Paulo, de sua agitação e sua atividade intensa (Martins, 1992). Mas, decisões tomadas fora da região vão fazer dela o lugar que abrigará o parque industrial mais importante do Mercosul e do Brasil. Inicialmente, no final do século XIX, em função da instalação da ferrovia São Paulo Railway, ligando Jundiaí ao Porto de Santos, para o escoamento da produção da lavoura cafeeira do oeste paulista, instalaram-se aqui inúmeras indústrias, fazendo com que na década de 30 a região já adquirisse um perfil claramente industrial. Esse perfil foi se consolidando com a construção da Via Anchieta, no final dos anos 40, e, nos anos 60, vai assistir à instalação das grandes montadoras na região, mudando em definitivo o seu perfil (Silva, 1994 apud Nakano, 2004).

 Apesar das decisões externas terem um grande peso na configuração do perfil industrial da região, os aspectos locacionais, também contribuíram para a configuração desse cenário.

 Ao longo de sua história, a Região viveu momentos de grande desenvolvimento econômico, período 1950 – 1970, e, a partir da década dos 80 até os dias de hoje, vem se deparando com uma intensa mutação no quadro da indústria, com o deslocamento de muitas delas para outros espaços do país e o fechamento de outras em função das dificuldades de enfrentar as novas exigências impostas pelo mercado. Esse quadro impacta a composição e estruturação do mercado de trabalho, havendo uma diminuição significativa de trabalhadores no setor industrial, um aumento das taxas de desemprego aberto e oculto. Além disso, crescem os números de empresas do setor serviços e do comércio. No entanto, é preciso ressaltar que esta mutação em andamento não pode ser interpretada como uma diminuição da importância da indústria no ABC, pois é exatamente em função da importância dela que o setor terciário pode se desenvolver nesta Região (Matteo, Tapia, 2002).

 Além da pujança do parque industrial do ABC, o que de fato vai tornar a região do ABC uma região peculiar foi e é a capacidade de agir de seus atores que vincaram na região a marca da luta operária.

 A luta operária teve início no nascedouro da própria indústria, contra as péssimas condições de trabalho a que estavam submetidos os trabalhadores e com forte influência anarco-sindical (1881 – 1922). Essa luta se estendeu pelas décadas de 30 a 50, influenciada pela forte presença do Partido Comunista Brasileiro - PCB, que além das questões específicas dos trabalhadores da região carregava bandeiras nacionais e internacionais contra o capitalismo e pela transformação da sociedade (1928 – 1948). O fim da década dos 70 e o início dos anos 80 viram surgir o novo sindicalismo na região, passando a ser referência de luta, nacional e internacionalmente, em função da capacidade autônoma dos trabalhadores e da politização das questões do trabalho (Médici, Pinheiro, 1990 apud Nakano, 2004).

 Assim, a região é remetida para fora de suas fronteiras por causa da importância do seu parque industrial e porque passa a ser referência de luta autônoma para os trabalhadores, quando se olha para ela a partir do país.

 Mas, quando se detém o olhar nos pequenos espaços e nos atores locais, percebe-se que toda a luta operária do ABC, desde sua emergência, veio acompanhada de inúmeras outras lutas e ações, acontecidas em outros espaços, como os bairros, as escolas, as igrejas, as associações. Além disso, também se encontram campos diversos de atuação: o religioso, o de gênero, o de geração, o de raça/etnia, o de meio ambiente, a saúde, a cultura, a polítca-partidária. Outros atores, além dos operários, produzem seus territórios e suas temáticas: os estudantes, as mulheres, os jovens, os trabalhadores da cultura, os professores, compondo um quadro ímpar (Martins, 1994; Vieitez, 1999 apud Nakano 2004). Todo esse amálgama de atores e ações compõe hoje a comunidade cívica da Região do ABC (Putnan, 1996), não sem a existência de sinais fragilidades e de contradições, a exemplo da existência dos Carecas do ABC, que têm o preconceito como móvel de sua ação e na violência uma forma singular de expressão (Costa, 1993 apud Nakano, 2004).

 De toda essa luta, em inúmeros espaços e a partir de temáticas diversas e necessidades específicas, os anos 90 viram surgir no ABC três instituições de âmbito regional, dando à região concretude institucional. Essa produção regional tem sido analisada como uma das experiências mais importantes dos últimos tempos porque parece avançar na busca de soluções para problemas regionais, articulando os sete municípios do ABC, bem como seus atores, tanto aqueles vinculados ao Estado, quanto os da sociedade civil. Essas instituições e os atores que a produziram atuaram e atuam no sentido de articular os elementos regionais, potencializando-os, na linha do “desenvolvimento endógeno”, também como condição para o estabelecimento de novas formas de relação com os atores externos à Região e que tomam decisões que impactam sobre ela. (Leite, 2003, Haddad, 2004, Arbix, Zilbovicius, 2002).

 Isso tudo não quer dizer que o ABC seja uma região marcada pela unidade. Ela é também a expressão da desigualdade própria das economias capitalistas. Assim, nesta região estão o município que ocupa o 1º. lugar no ranking de exclusão social do país, São Caetano do Sul, porque detém os melhores indicadores de qualidade de vida, convivendo com o município que ocupa o 2.096ª. posição do ranking de exclusão, Rio Grande da Serra (Pochmann, Amorim, 2003 apud Nakano, 2004).

 Não distinguiríamos entre unidade e diversidade, se não soubéssemos que a unidade é o próprio do planeta e da história e a diversidade é o próprio dos lugares. Os eventos operam essa ligação entre os lugares e uma história em movimento. A região e o lugar, aliás, definem-se como funcionalização do mundo e é por eles que o mundo é percebido empiricamente. A região e o lugar não têm existência própria. Nada mais são que uma abstração, se os considerarmos à parte da totalidade. Os recursos totais do mundo ou de um país, quer seja o capital, a população, a força de trabalho, o excedente etc., dividem-se pelo movimento da totalidade, através da divisão do trabalho e na forma de eventos. A cada momento histórico, tais recursos são distribuídos de diferentes maneiras e localmente combinados, o que acarreta uma diferenciação no interior do espaço total e confere a cada região ou lugar sua especificidade e definição particular. Sua significação é dada pela totalidade de recursos e muda conforme o movimento histórico. (Santos, 2002: 165)

 Se a unidade e visibilidade adquiridas pelo ABC são tributárias de processos de indução da ordem externa – a indústria e o capital industrial que nele se estabelecem, outros ritmos e práticas sócio-políticas de atores e agentes sociais internos à região manifestamente esforçaram-se para a fabricação e sedimentação da idéia do ABC como unidade, tanto material como política e cultural.

 Na Região, desde meados da década de 80, as administrações locais do ABC contam com governos gestados por partidos progressistas e de natureza democrática, sobressaindo-se o PT em Diadema, Santo André, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Em São Bernardo do Campo, desde 1989, tem ocorrido uma alternância de partidos progressistas no governo municipal, tais como, PT, PSDB, PPS e PSB. Neste quadro, a exceção recai sobre São Caetano do Sul que, historicamente, conta com sucessivos governos locais de natureza conservadora e populista gestados por representantes do PPB, ou do PFL, ou do PTB. 

 Esta conjuntura histórica regional permitiu que a maioria dos governos das administrações municipais do ABC instituísse novos padrões de interações entre o Estado – na sua dimensão local – e a sociedade, assim como implementassem políticas públicas voltadas para o desenvolvimento social, a conquista de direitos e a participação social de seus moradores.

 É neste quadro de referências que vemos surgir na Região, desde 1983/4, investimentos públicos efetuados pelos executivos municipais nas áreas da educação básica (educação infantil, ensino fundamental, ensino médio) e do ensino superior que, inequivocamente, têm contribuído para o incremento dos indicadores de escolaridade de distintas gerações (infantil, juvenil e adulta) de cada um dos municípios e da Região. Apesar dos efeitos impostos por legislações nacionais que impactaram fortemente a distribuição de recursos, os executivos locais instituíram políticas com recursos quase que exclusivamente municipais na produção de políticas públicas nos mais diversos campos. Entre 1987 e 2000, o ABC viu nascer um conjunto significativo de programas, projetos e ações no campo da educação de jovens e adultos, a maior parte deles marcados pela idéia do direito à educação e contra o aligeiramento existente nas políticas compensatórias, como a da educação supletiva.

 Além disso, desde os anos iniciais da década de 90, os sete executivos locais do ABC têm produzido um acúmulo de experiências na efetivação de projetos ou propostas de atuação para e com a juventude. Muitas das ações empreendidas, a exemplo do ocorrido nos níveis estadual e federal de governo, se concretizaram pela mediação de políticas setoriais da educação, cultura, esporte, lazer, saúde e assistência ou promoção social, outras focalizaram direta e especialmente alguns setores ou segmentos da população juvenil, notadamente os segmentos jovens das camadas populares. 

 A partir de 1997, os governos locais de Santo André (1997), São Bernardo do Campo (em 1998), Diadema (em 2003), Ribeirão Pires (em 2001) e São Caetano do Sul (em 2003) principiaram o ciclo vital de institucionalização de ações públicas para juventude, mediante a constituição de instâncias ou órgãos destinados a assessorar ou coordenar as ações, a designação legal de gestores públicos para dirigir as assessorias ou coordenadorias e a destinação de recursos orçamentário-financeiros para a formulação e implementação de programas, projetos, atividades e eventos para a juventude.

 Este trabalho tem como perspectiva apresentar algumas hipóteses levantadas quando da conclusão da primeira fase do estudo mencionado, de maneira especial sobre as políticas educacionais destinadas a jovens e adultos.

 

As duas gerações de políticas públicas de educação de jovens e adultos do ABC: 1987 a 2003

 A Região do ABC, entre 1979 e 1980, foi o palco de ações inusitadas no campo das lutas democráticas em nosso país, quando um conjunto diversificado de atores tomou conta das praças e das ruas, ganhou visibilidade, não como identidades particulares, mas por algo comum que os unia naquele “momento de fusão”: de defesa do direito de fazer greve dos operários e de suas lideranças que estavam presas.

 As identidades constituídas nos clubes de mães, nos grupos de fábrica, no “sindicalismo autêntico”, nas comissões de saúde, embora mutáveis e mutuamente influenciáveis, permaneceram diversas. Os acontecimentos cruciais, onde se encontraram e que constituíram “momento de fusão”, produziram novas formas de identidade coletiva que criaram referências comuns mais abrangentes e vínculos maiores. Assim se deu basicamente nas greves de 1979-80 (em São Bernardo do Campo). (Sader, 1988: 312).

 Mas, se até este momento permaneciam as identidades singulares, e o “momento era de fusão”, pouco a pouco, elas vão sendo recobertas pela ação sindical e, gradativamente, pela ação partidária. É neste processo que vemos nascer as políticas públicas de educação de jovens e adultos no ABC, não só como programas estruturados e institucionalizados no interior do Estado, mas como conjunto de decisões e ações destinadas à resolução de problemas políticos (Rua, 1998: 731), expressão de possíveis conflitos que se manifestam na disputas de recursos e bens, envolvendo um campo de negociação.

 Além do forte impacto das ações dos atores locais nas políticas públicas de jovens e adultos do ABC, é preciso considerar as injunções externas à região para entender as alterações dessas políticas nesse mesmo território.

 É a partir dessas percepções que será feita a análise da instituição dos serviços de educação de jovens e adultos nos municípios do ABC, no período de 1987 a 2000.

 Os municípios do ABC, desde 1987, percorreram um caminho no sentido de instituir políticas públicas de educação de jovens e adultos, sendo possível identificar, em 2003, três grandes modalidades de programas, projetos e ações:

 MOVA Regional e PROALFA, estruturados por atores diversos, do poder público e da sociedade civil, como ação civil pública para a erradicação do analfabetismo, em alguns casos como a garantia de adultos e jovens cursarem até o 1º segmento do Ensino Fundamental;

 Ensino Fundamental e Ensino Médio de educação de jovens e adultos (EJA, SEJA e PROMAC), estruturado no interior do sistema municipal de educação, como uma das vertentes da escola;

 Telecurso, Ensino Fundamental- 2º segmento e Ensino Médio, uma reprodução de proposta concebida fora do âmbito municipal, pela Fundação Roberto Marinho, assumida pelo executivo local.

 A existência dessas três modalidades de política de educação de jovens e adultos não significa que no interior de cada uma delas não haja diferenças. Um olhar mais acurado sobre cada uma delas permite encontrar não apenas três, mas seis modalidades distintas.

 Para analisar cada uma delas pretende-se, inicialmente, apresentar um quadro descritivo de cada um dos programas, projetos e ações e, posteriormente, analisar as diferentes concepções das políticas, a sua implementação, o perfil dos gestores nelas envolvidos, finalizando com a análise sobre a população atendida, bem como a concepção sobre jovem verbalizada pelos gestores e como ela conforma as políticas.

 

 

1. Descrição dos programas, projetos e ações

 Os programas, projetos e ações voltados para o atendimento de jovens e adultos existentes nos municípios do ABC variam muito quanto ao nível de atendimento. Além disso, agrupamentos de municípios e mesmo ações comuns, também variam os níveis de atendimento. O Quadro 1 permite verificar essa diversidade.

 

Quadro 1. Educação de jovens e adultos no ABC - Níveis de atendimento 2003

Município

Programa/

Projeto/

Ação

Nível de atendimento

Alfabetização

Ensino

Fund.

1º Seg.

Ensino

Fund.

2º Seg.

Ensino Médio

R. Gde da Serra

MOVA

XXXXX

 

 

 

S. Caetano do Sul

PROALFA

XXXXX

 

 

 

Ribeirão Pires

MOVA

XXXXX

XXXXX

 

 

Santo André

MOVA

XXXXX

XXXXX

 

 

 

SEJA

 

XXXXX

 

 

Diadema

MOVA

XXXXX

XXXXX

 

 

EJA

XXXXX

XXXXX

XXXXX

 

São Bernardo

MOVA

XXXXX

 

 

 

PROMAC

 

XXXXX

XXXXX

 

Telecurso

 

 

XXXXX

XXXXX

Mauá

MOVA

XXXXX

 

 

 

EJA

XXXXX

XXXXX

XXXXX

XXXXX

 

 

Ganha destaque um conjunto de ações desenvolvidas por todos os municípios do ABC no sentido de erradicar o analfabetismo e, em alguns casos, garantir escolaridade até a 4ª série do Ensino Fundamental. Em torno dessas ações articulam-se diferentes atores da sociedade civil e do executivo local.

 Dos sete municípios do ABC, seis deles – cinco governados pelo PT e um pelo PSB - implantaram o MOVA Regional - Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos da Região do ABC, como um movimento regional de combate ao analfabetismo. Esta modalidade de ação foi incorporada à base de dados das políticas públicas porque, atualmente, ela é quase que integralmente financiada com recursos dos orçamentos municipais, bem como as suas coordenações são ocupadas por profissionais do quadro de funcionários das prefeituras.

 Este movimento deve ser analisado para além dos objetivos educacionais, pois a ele está incorporada a questão regional. Nessa medida, ele merece ser objeto de estudo mais aprofundado.

 São Caetano do Sul é o único município que não aderiu ao MOVA Regional e organizou um projeto próprio, denominado PROALFA – Projeto de Alfabetização de Jovens e Adultos, também em parceria com um ator local e coordenado por profissional da Administração Municipal.

 Assim, pode-se dizer que todos os municípios do ABC desenvolvem ações no sentido de erradicar o analfabetismo com políticas muito similares. Esse tipo de ação, juntamente com a universalização do Ensino Fundamental, para as crianças e adolescentes de 7 a 14 anos, e a diminuição substantiva da chegada de novos migrantes para o ABC, especialmente a partir da década dos 80, explicam porque o índice de alfabetização [2] , em todos os municípios do ABC, se aproxima de 1, situação considerada ideal[3] , quando se toma para análise os índices produzidos por Pochmann et al, 2003. (Tabela 1).

 

Tabela 1 - Índice de Escolaridade e de Alfabetização – Municípios do ABC 2000

Municípios do ABC - 2000

Índice de escolaridade

Índice de alfabetização

Diadema

0,600

0,886

Mauá

0,603

0,886

Ribeirão Pires

0,689

0,909

Rio Grande da Serra

0,569

0,866

Santo André

0,754

0,921

São Bernardo

0,769

0,912

São Caetano

0,878

0,949

Fonte: Atlas da exclusão social no Brasil. Pochmann et al. 2003.

  

 

Dentre os municípios que garantem que jovens e adultos possam cursar até a 4ª série do Ensino Fundamental, no MOVA, estão Diadema, Santo André e Ribeirão Pires. No caso deste último município, esta é a única ação voltada para a educação de jovens e adultos. No caso dos outros dois municípios, o MOVA pode ser considerado complementar aos serviços de educação de jovens e adultos instituídos em período anterior a este movimento.

 Além das ações de erradicação do analfabetismo, também, encontramos no ABC a configuração de um campo escolar, como políticas de governos locais, voltado exclusivamente para a educação de jovens e adultos. Os municípios de Diadema, Santo André e São Bernardo do Campo criaram, respectivamente, EJA - Educação de Jovens e Adultos, o SEJA - Serviço de Educação de Jovens e Adultos, o PROMAC – Programa Municipal de Alfabetização e Cidadania. Todos esses programas garantem o Ensino Fundamental, 1º e 2º segmentos, a jovens e adultos.

 O município de Mauá instituiu também um serviço, tal como Diadema, denominado EJA - Educação de Jovens e Adultos, garantindo o Ensino Fundamental e Médio.

 A última modalidade de ação no campo da educação de jovens e adultos, o Telecurso, no município de São Bernardo, garante o atendimento de alunos do 2º segmento do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.

 Assim, Diadema e Santo André, para garantir o Ensino Fundamental combinam dois tipos de políticas: o MOVA e um serviço de educação de jovens e adultos na modalidade escolar.

 Por sua vez, Mauá garante o atendimento no Ensino Fundamental e no Médio, apenas por meio do EJA. Através do MOVA este mesmo município procura garantir uma aproximação da escola àqueles que estão fora dela. É interessante procurar conhecer como os MOVAs se estruturam na Região, em função dessa diversidade.

 São Bernardo do Campo, por meio das três políticas - MOVA, PROMAC e Telecurso – garante, de forma complementar, o atendimento de alfabetização ao ensino médio.

 

 

2. Os tempos do ABC, as concepções das políticas de educação de jovens e adultos e o nível de institucionalização

 As concepções das diferentes políticas de educação de jovens e adultos no ABC parecem relacionar-se, no momento de seu surgimento, diretamente com as posições político-partidárias daqueles que estavam governando a cidade. Da concepção também decorre um determinado nível de institucionalização das políticas.

 

 Quadro 2 - Políticas de educação de jovens e adultos – Políticas públicas, Municípios, Partidos 1987 – 2000

Ano de Instituição

Política pública

Município

Partido

1987

EJA

Diadema

PT

1988

 

 

 

1989

SEJA

Santo André

PT

1990

 

 

 

1991

PAC[4]

São Bernardo do Campo

PT

1992

 

 

 

1993

EJA

Mauá

PMDB

PROMAC[5]

São Bernardo do Campo

PSB

1994

 

 

 

1995

Telecurso

São Bernardo do Campo

PSB

MOVA

Diadema

PT

1996

 

 

 

1997

MOVA

Santo André

PT

MOVA

Mauá

PT

MOVA

Ribeirão Pires

PT

1998

MOVA

São Bernardo do Campo

PSB

1999

PROALFA

São Caetano do Sul

PTB

2000

MOVA

Rio Grande da Serra

PT

Data-base:2003

 

 

O Quadro 2 permite verificar que, na década dos 80, foram desencadeadas políticas de educação de jovens e adultos nos municípios de Diadema e Santo André.

 O governo municipal do município de Diadema, sob a égide do Partido dos Trabalhadores, inaugura, em 1987, a concretização da idéia do direito à escolarização de jovens e adultos que não tiveram acesso à escola ou que dela tivessem sido excluídos. Há aqui uma antecipação daquilo que seria aprovado em 1988 na Constituição Federal, em seu artigo 208, no qual consta o dever do Estado com a educação: “ensino fundamental, obrigatório  e gratuito, inclusive para os que a ele não tiverem acesso na idade própria”.

 Ainda nesta década, na esteira de Diadema, Santo André e São Bernardo do Campo, respectivamente em 1989 e 1991, também instituíram serviços voltados exclusivamente para jovens e adultos.

 Estas iniciativas devem ser entendidas no quadro das lutas pela democratização que percorreram o país, ao longo da década dos 80, e que tiveram na figura de alguns sindicatos e do Partido dos Trabalhadores, com fortes elos entre si, atores centrais. Não sem razão, os dois serviços de educação de jovens e adultos surgem em governos petistas e estão situados na região do sindicato que ganhou maior visibilidade, o dos metalúrgicos de Santo André e de São Bernardo do Campo e Diadema.

 Em 2003, ano do levantamento de dados da presente pesquisa, é inequívoco que essas políticas já estão consolidadas. Em Diadema o serviço já durava 16 anos, em Santo André, 14 anos, e em São Bernardo do Campo, 12 anos. Neste último caso, com uma outra denominação.

 Elas são desenhadas à luz da idéia de direitos, fortemente explicitados no caso de Santo André e Diadema.

 Na aquisição dos direitos sócio-políticos que fundam o conceito de cidadania plena de forma que os educandos possam investir na conquista e na ampliação desses direitos. (Objetivos do SEJA – Santo André)

 Levar o educando à a aquisição do conhecimento, para fazer dele um instrumento de vivência no exercício de sua prática social. (Objetivo do EJA – Diadema)

 Na década dos 90, dela excluído o ano 1991 e incluído o ano 2000, foram instituídas políticas de educação para jovens e adultos em todos os demais municípios do ABC e, de forma complementar aos serviços já existentes, em Diadema, Santo André e São Bernardo do Campo, outras modalidades de política neste campo específico.

 O conjunto de políticas instituídas evidencia uma tendência gradativa de alteração dessas políticas, com recorte claramente escolar, para outras recortadas por uma ação civil pública no combate ao analfabetismo, caracterizando claramente a existência de duas gerações de políticas no ABC: a primeira geração é a das políticas de escolarização, como responsabilidade do Estado, instituídas na estrutura administrativa dos municípios de Diadema, Santo André, São Bernardo do Campo e Mauá; e a segunda, a de ações marcadas pela articulação de diferentes atores na condução da política, envolvendo o Estado e a sociedade civil. Nesta última geração de políticas o Estado já não se responsabiliza sozinho pela erradicação do analfabetismo.

 Ainda em 1993, claramente na vertente escolar, vemos a transformação do PAC de São Bernardo do Campo em PROMAC e a criação do EJA no município de Mauá.

 Essas duas políticas ainda são recortadas pela idéia da escola como direito, como se pode depreender das concepções que as percorrem.

 Contribuir para o desenvolvimento das potencialidades intelectuais e culturais do jovem e adulto, respeitando suas necessidades e revelando seus saberes, viando a promover o acesso a outros conhecimentos... para o exercício pleno da cidadania. (Objetivos do PROMAC – São Bernardo do Campo).

 Erradicar o analfabetismo na cidade e incentivar a continuidade nos estudos. (Objetivo do EJA – Mauá).

 A partir de 1995 vemos surgir no ABC, também por meio de uma ação desencadeada em Diadema com a criação do MOVA, políticas cujo recorte marcante é o da participação da sociedade civil no combate a um problema existente na região, o do analfabetismo. Pode-se dizer que os sete municípios, em 5 anos, adotam práticas nesse sentido. São Caetano do Sul é o único município que não aderiu ao MOVA, o que não quer dizer que não tenha desencadeado ações similares,  pois o PROALFA cumpre a mesma função, conforme pode ser observado na análise das concepções dessas políticas.

 Nos sete municípios do ABC, as idéias de direito, cidadania e participação crítica e inserção social percorrem todos os MOVAs locais, bem como o PROALFA. Sobre este último é importante frisar que o município expressa claramente a intenção de erradicar o analfabetismo de forma a atingir o nível mais próximo de zero.

 Além dessas características que são comuns, Santo André e Ribeirão Pires buscam relacionar as ações dos MOVAs locais com as questões do mundo do trabalho, assim são propostos objetivos vinculados à empregabilidade e à profissionalização.

 O grau de institucionalização das políticas permite reafirmar ou não as concepções expressas pelos gestores naquilo que diz respeito ao papel do Estado e da sociedade civil.

 Assim, em quase todas as políticas de educação de jovens e adultos da primeira geração pode-se observar a existência de uma instância, formalmente instituída na estrutura das secretarias de educação, responsável pela política. Em Diadema encontramos a Divisão de Educação de Jovens e Adultos, em Santo André, a Gerência de Educação de Jovens e Adultos, em São Bernardo, a Secção de Educação de Jovens e Adultos. Somente no Município de Mauá, as atribuições estão diluídas num grupo profissional genérico de Coordenação Técnica.

 Já nas políticas da segunda geração pode-se perceber que essa tendência de institucionalização já não é mais observada como marca predominante. Nos municípios em que havia políticas da primeira geração, há uma tendência de atribuir a responsabilidade da condução do MOVA à mesma instância responsável pelo EJA e PROMAC. Há uma exceção, no município de Santo André, o MOVA fica afeto DET – Departamento de Educação do Trabalho, dando ênfase, por meio desta vinculação, às relações educação e trabalho, no caso desta política.

 Ainda nas políticas da segunda geração, vamos encontrar o MOVA sendo conduzido por dirigente de creche (Rio Grande da Serra), por professoras de Educação Infantil (São Caetano do Sul) e por um coordenador técnico I (Ribeirão Pires), evidenciando uma clara diluição desta política no interior do aparato do Estado.

 Resta investigar como esta segunda geração de políticas está consolidando a idéia à educação de direito de jovens e adultos na Região do Grande ABC, numa estreita relação com a atuação dos diferentes atores, pois os MOVAs surgem no contexto da discussão sobre a região do ABC, que deu origem a três instituições marcadas pelo recorte regional, iniciado em 1990 com a criação do Consórcio Intermunicipal do Grande ABC, e que se fortaleceu com a instituição da Câmara Regional do ABC (1997) e a Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC (1998). As políticas da primeira geração nascem de um movimento voltado para fora, pela redemocratização do país, com fortes raízes locais; as políticas de segunda geração nascem de um movimento interno, de auto-reconhecimento regional, pelas mãos dos atores dos sete municípios do ABC.

 

  

3. Políticas de educação de jovens e adultos – a questão da participação

 Pode-se afirmar que cinco das doze políticas implementadas recebem recursos financeiros não-estatais. Estes compõem as dotações orçamentárias dos municípios. Relativo ao espaço onde acontecem as práticas, também é possível depreender que a sociedade civil participa de forma ativa nas políticas de segunda geração e também caracteriza as políticas desta geração a relação com outras ações, não necessariamente do campo da educação.

 Os dados das Tabelas 2 e 2.1 permitem aprofundar as reflexões sobre a relação entre o Estado e a Sociedade Civil na implementação das políticas.

  

 

Tabela 2 - Natureza das parcerias – nas políticas de primeira geração

Município

Política

Parceiros

Identificação dos atores

Recursos financeiros

Cessão de espaço físico

Recursos humanos

Assessoria técnica

Diadema

 

EJA

 

Prefeitura

X

x

X

x

1º parceiro

0

0

0

0

0

2º parceiro

0

0

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

Mauá

EJA

 

Prefeitura

X

x

X

x

1º parceiro

0

0

0

0

0

2º parceiro

0

0

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

Santo André

SEJA

 

Prefeitura

X

s/inf

s/inf

s/enf

1º parceiro

0

0

0

0

0

2º parceiro

0

0

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

São Bernardo do Campo

PRO-

 

MAC

 

Prefeitura

X

x

X

x

1º parceiro

UMESP

X

0

X

x

2º parceiro

0

0

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

Data-base:2003

 

  

As políticas de primeira geração são integralmente mantidas pelos executivos locais, apenas São Bernardo do Campo tem como parceiro a Universidade Metodista de São Paulo. Assim, pode-se afirmar que a implementação dessas políticas tem no Estado o ator central. Elas compõem a geração de políticas públicas integralmente mantidas pelo Estado, nos moldes do estado provedor.

 

  

Tabela 2.1 - Natureza das parcerias – nas políticas de segunda geração

Município

Política

Parceiros

Identificação dos atores

Recursos financeiros

Cessão de espaço físico

Recursos humanos

Assessoria técnica

Diadema

MOVA

 

Prefeitura

X

0

X

X

1º parceiro

Entidades da sociedade civil

0

X

0

0

2º parceiro

Igrejas

0

X

0

0

3º parceiro

Centros Comun.

0

X

0

0

Mauá

MOVA

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

Empresas

X

X

X

0

2º parceiro

Entidades

X

X

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

Ribeirão Pires

MOVA

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

Federação SABs

0

X

X

0

2º parceiro

Igrejas e escolas

0

X

0

0

3º parceiro

Empresas e sindicatos

X

0

0

0

Rio Grande da Serra

MOVA

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

Ford

X

0

0

0

2º parceiro

Sindicodiv

X

0

0

0

3º parceiro

Unibanco

X

0

0

0

Santo André

MOVA

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

Entidades da sociedade civil

0

X

X

0

2º parceiro

Empresas

X

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

São Bernardo do Campo

TELE-

 

CURSO

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

SESI

0

0

X

X

2º parceiro

0

0

0

0

0

3º parceiro

0

0

0

0

0

São Bernardo do Campo

MOVA

 

Prefeitura

X

X

X

0

1º parceiro

UMESP

0

0

X

X

2º parceiro

Igrejas e SABs

0

X

0

0

3º parceiro

empresas

X

X

0

0

São Caetano do Sul

 

 

 

 

 

PRO-ALFA

 

Prefeitura

X

X

X

X

1º parceiro

Instituto Mauá de Tecnologia

X

0

X

0

2º parceiro

Escolas estaduais

0

X

0

0

3º parceiro

Fundação Anne Sullivan

0

X

X

X

Total de ações/prefeituras – segundo o tipo de participação (excetuadas as parcerias)

8

 

(100%)

8

 

(100%)

7

 

(87,5%)

8

 

(100%)

8

 

(100%)

Total de parceiros pesquisados – segundo o tipo de participação (excetuadas as Prefeituras)

24

 

(100%)

 

9

 

(37,5%)

12

 

(50%)

7

 

(29,2%)

3

 

(12,5%)

Data-base:2003

 

  

Em todos os municípios, as políticas de segunda geração contam com parcerias para a sua execução. Mas, inequivocamente, são os executivos locais os maiores responsáveis por isso. Todos eles garantem recursos financeiros, cessão de espaço físico (com exceção de Diadema), recursos humanos e assessoria técnica. Isso permite dizer que essas políticas são percorridas pela idéia do direito à educação como dever do Estado. Parece que estas políticas encontram-se a meio caminho entre aquelas totalmente mantidas e executadas pelo Estado, tais como as políticas de primeira geração aqui estudadas, e aquelas em que os parceiros dividem igualmente as responsabilidades. Um aprofundamento do estudo poderá jogar luz sobre essa questão.

 A participação mais significativa dos parceiros se dá no quesito cessão de espaço físico. Aqui é preciso salientar que a presente pesquisa captou apenas três parceiros de cada uma das políticas. Os dados da Tabela 2 permitem afirmar que relativo a este item há um número maior de parceiros do que aquele que consta da Tabela 2.1, pois o MOVA conta com salas, inclusive, em residências particulares, o que pode indicar a existência de uma capilaridade desta ação, também a ser mais bem estudada.

 Ainda concernente à participação da sociedade civil, a sua presença fica mais diluída quando se trata de recursos humanos e assessoria técnica. Parece se repetir nas políticas de segunda geração, a tradicional ausência da sociedade civil no debate das questões pedagógicas.

 Sobre a participação da sociedade civil, no quesito recurso financeiro, é necessário diferenciar as políticas de primeira geração das de segunda. Conforme já apresentado no item financiamento, aquelas são financiadas quase exclusivamente, quando não na totalidade, pelo Estado. A participação de outros atores é pouco significativa, pois se restringe a 5% do total dos recursos do orçamento de 2002 dos municípios de Mauá e Santo André.

 Diferentemente, nas políticas de segunda geração, pode-se dizer que é significativa a atuação dos atores, pois do total de parceiros pesquisados, 37,5% deles participam com recursos financeiros. Mas, os dados da Tabela 8 permitem verificar que essa a participação varia de município para município, podendo agrupá-los em três situações: a) num pólo, aqueles em que os executivos locais arcam com a totalidade ou a maior parte dos recursos financeiros (Diadema e São Bernardo do Campo com 100%, Santo André, com 99%, Rio Grande da Serra, 78,4%); b) numa posição intermediária, aqueles em que há uma divisão eqüitativa entre os atores envolvidos, em termos de participação quanto a recursos financeiros (Ribeirão Pires e Mauá). Neste grupo, encontra-se o único município com recurso federal; c) num outro pólo, aquele em que apenas um ator da sociedade civil arca com a quase totalidade dos recursos financeiros (São Caetano do Sul, 90%).

 

Considerações finais:  políticas de jovens e adultos e o segmento juvenil

 Toda a discussão realizada até aqui permitiu uma breve aproximação às políticas de educação de jovens e adultos na Região do Grande ABC. Agora, é importante realizar a discussão sobre essas mesmas políticas, a partir de um olhar focado no segmento juvenil, 15 a 24 anos, especialmente porque há o fenômeno do rejuvenescimento da população atendida e decorrente disso a necessidade de ampliar o olhar sobre as práticas desenvolvidas, para além das necessidades e interesses dos adultos.

 A pesquisa revelou que as prefeituras não organizam dados relativos à questão etária, com exceção de Santo André. Isso impediu que fossem obtidos dados globais sobre o fenômeno do rejuvenescimento e também revela que os programas de educação de jovens e adultos do ABC não utilizam – idade - como elemento da organização das ações.

 

 

Tabela 3 - Público destinatário do programa, número de vagas por faixa etária – Santo André 2001 - 2003

Faixa etária

2001

2002

2003

Faixa etária (anos)

SEJA

MOVA

SEJA

MOVA

SEJA

MOVA

No abs

%

No abs

%

No abs

%

No abs

%

No abs

%

No abs

%

10-14

0

0

45

2,4

0

0

60

2,6

0

0

8

0,4

15-19

285

9,5

141

7,5

290

10,2

163

6,9

228

8,3

90

4,5

20-24

414

13,9

153

8,1

370

13,0

196

8,4

303

11,1

159

7,9

25-19

467

15,6

282

14,9

415

14,6

306

13,0

428

15,6

273

13,5

30-39

769

25,8

343

18,1

731

25,7

393

16,7

727

26,6

553

27,4

40-49

495

16,6

428

22,6

519

18,2

537

22,9

521

19,0

420

20,8

50 ou mais

555

18,6

500

26,4

519

18,2

695

29,6

528

19,3

513

25,4

Total

2985

100

1892

100

2844

100

2350

100

2735

100

2016

100

Sub-total das faixas etárias 15-19 e 20-24

 

23,4

 

15,6

 

23,2

 

15,3

 

19,4

 

12,4

Sub-total das faixas etárias acima dos 25 anos

 

76,6

 

82%

 

76,8

 

82,1

 

80,6

 

87,2

Data-base:2003

 

 

 Ao comparar os dados da tabela 3, referentes aos anos 2001 a 2003, é possível afirmar que: a) a população atendida no SEJA e no MOVA de Santo André é formada majoritariamente por adultos, sendo que neste último serviço há mais adultos em termos proporcionais do que no SEJA; b) há mais jovens no SEJA do que no MOVA. Naquele programa, um pouco menos de um quarto dos alunos encontrava-se na faixa etária de 15 a 24 anos, nos anos 2001 e 2002. No MOVA, o percentual não ultrapassava a casa dos 15,6%, no ano 2001. É preciso investigar se este fenômeno se repete em outros municípios e caso isto ocorra é importante saber por que os jovens estão mais em programas da modalidade do SEJA do que do MOVA.

 Apenas esses dados não permitem dizer que há um processo de rejuvenescimento da população que freqüenta as ações de educação de jovens e adultos, mas permitem afirmar que o percentual de alunos jovens é significativo. Apesar disso, os diferentes municípios não se organizaram ainda para a produção de estatísticas, considerando as idades, que permitam acompanhar este fenômeno, de forma a subsidiar a discussão e a proposição de ações que considerem as diferentes fases da vida. “Se a reflexão é sem referência etária, a sociedade não pode organizar as idades, como os sexos, as classes sociais e as culturas: as quatro dimensões de toda a sociedade.” (Gaullier, 1998: 2).

 Isso pode revelar a existência de uma concepção de cidadão abstrato, sem idade, e no caso de alguns municípios, tal como já se apontou anteriormente, também como trabalhador abstrato. Nessa medida, a juventude não é considerada como uma fase da vida, com peculiaridades, e que pela sua situação pode polemizar os valores e projetos da geração adulta, apontando para novas possibilidades de futuro. Por sua vez, os jovens, sujeitos concretos, podem ficar submetidos à figura simbólica de aluno, sem que seus interesses e necessidades, marcados pela condição etária, possam vir à tona marcando os desenhos das políticas públicas de educação de jovens e adultos e sua forma de implementação.

 Enfim, essa é uma questão a ser investigada num estudo de caso para trazer luz sobre a organização das políticas tendo como referência a questão etária.

 

  

Referências

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[1]Trata-se de investigação pluri-institucional, coordenada em nível nacional pelos Professores Marilia Pontes SPOSITO e Sergio Haddad. Contou com apoios institucionais da FAPESP, CNPq e Centro Universitário Fundação Santo André. Nesta etapa da pesquisa, contou-se com a colaboração da Profa. Ms. Maria Cristina Cavaleiro e dos seguintes auxiliares de pesquisa, bolsistas do PIC do CUFSA: Carolina Marete André, Daniela Assensio Galdi, Fabiane Buzzo Carrion, Márcia José Pereira, Maurício Osório Gonçalves, Natali Viana Sales, Rosa Maria Sena.

[2] O “Atlas da exclusão” do Brasil toma como referência cada um de seus municípios. Ao fazê-lo, são trabalhados diversos índices, dentre eles o de escolaridade e o de alfabetização que “quantifica a participação da população no legado técnico-cultural da sociedade. Para isso, apurou-se o tema Conhecimento por meio dos indicadores ‘anos de estudo do chefe de família’ e ‘alfabetização da população acima de cinco anos de idade”. (Pochmann et al, 2003: 17).

 

[3] “Para interpretar o resultado de cada município brasileiro basta ter em mente duas coisas: 1) o índice varia de zero a um; 2) as piores condições de vida equivalem a valores próximos a zero, enquanto as melhores situações sociais estão próximas de um”. (Pochmann et al, 2003: 19).

[4] PAC – Programa de Alfabetização e Cidadania, de São Bernardo do Campo, instituído em 1991.

[5] O PROMAC substituiu o PAC.

 


 
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